sexta-feira, 16 de julho de 2010

ESTADO DA NAÇÃO: DISCURSO

Sim pusemos as contas públicas em ordem! Mas fizemos mais: restaurámos a credibilidade do Estado Português!

(José Sócrates, Estado da Nação, 20 Julho 2009)

Um ano depois, Portugal tem o maior endividamento da Europa; a maior carga fiscal de sempre; a maior despesa pública de sempre; o maior desemprego de sempre.

- Um ano depois, Portugal é uma Nação em que a esperança é cada vez mais rara; e em que os vexames internacionais são cada vez mais frequentes.

- A forma como o Primeiro-Ministro conduziu o país, conduziu o País até aqui. Revisitar aquela sua proclamação as contas estão em ordem! Restauramos a credibilidade de Portugal é apenas um expressivo exemplo de como o sr. é um PM de quem hoje se pode dizer que tem contactos curtos e intermitentes com a realidade.

Senhor Primeiro-Ministro: alguém tem de lhe dizer que o senhor é o homem errado para esta hora difícil.

- Os Portugueses sabem que qualquer semelhança entre o que o PM disse, antes das eleições, e o que o PM fez, depois das eleições, é uma mera coincidência. Na verdade, o senhor

a) mentiu, sobre o valor do défice;

b) subestimou, a questão do endividamento;

c) ludibriou, quanto aos impostos;

d) iludiu, sobre o TGV, Auto-estradas e Aeroporto;

e) pantominou, sobre os fundos comunitários da Agricultura;

f) errou, na avaliação dos professores;

g) facilitou, no Estatuto do Aluno;

h) enganou, nas leis penais;

i) incumpriu, sobre o reforço das polícias;

j) negou o que dissera, nas prestações Sociais; e

k) Como todo o país sabe, fantasiou nas SCUTs.

Não olhes para o que eu digo, olha para o que eu faço. É precisamente por isso que muitos portugueses pensam que o senhor já não tem um Programa de Governo; o que o senhor tem é o que sobra do que resta de um Programa Eleitoral.

- Como sabe, há quem diga que é possível enganar muita gente, pouco tempo; ou pouca gente, muito tempo; o sr. foi mais longe e quis enganar toda a gente ao mesmo tempo. É por isso que hoje, em Portugal, os satisfeitos são poucos e os desiludidos são imensos. São:

a) os jovens, cada vez mais desamparados para encontrar um emprego;

b) os casais desempregados, a quem aceitou dar e logo retirou um apoio melhor;

c) os idosos, a quem penalizou na pensão e vai penalizar nos remédios;

d) os doentes, a quem prometeu a unidose que nunca chegou;

e) as Misericórdias, com quem nem negociou nem assinou o acordo que anunciou;

f) as PMES, sufocadas entre o crédito que já não há e os impostos e contribuições que vêm aí;

g) os aforradores a quem aumenta impostos e muda regras;

h) os contribuintes a quem vai aumentar impostos duas vezes em 6 meses;

i) os agricultores, que desprezou, empobreceu e levou ao desespero;

j) os juízes, a quem tira e põe férias como quem muda de camisa;

k) as Forças de Segurança, a quem nunca protegeu, nem nos recursos, nem nas leis;

l) os imigrantes, a quem uma política laxista vendeu ilusões e por isso hoje tem 40 mil estão no desemprego;

m) os professores, a quem nenhum outro político destruiu tanto o brio e a motivação;

n) e os funcionários, generosamente aumentados em ano eleitoral, mas hoje mira e alvo do PEC 4, sejam bons ou sejam maus, no seu zelo.

E por aí fora, por aí fora, sr. PM. Estes Portugueses nunca mais acreditarão na sua palavra.

- O Governo que não foi capaz de reconhecer os problemas, antes das eleições; e não é capaz de cumprir a sua palavra, depois das eleições. Mas acresce um PM que pratica o auto-elogio como religião pessoal, a um ponto que deixa estupefactos, quando não indignados, os portugueses que são prosaicamente realistas. O sr. PM que já disse que Portugal é campeão na retoma, que Portugal é campeão na saída da recessão, que Portugal é campeão no crescimento e que Portugal é campeão nas reformas.

Olhe, sr. PM, ano e meio depois de ter anunciado a retoma, não chegou retoma nenhuma; veja lá se Portugal não vai ser o único país da zona euro a entrar outra vez em recessão, depois de todos saírem dela; não enfabule: se Portugal crescer 0.9% este ano, 12 países da zona euro vão crescer mais do que nós; e se Portugal crescer 0.2% no próximo ano, isso significa que 25 países da União Europeia vão crescer mais, muito mais, do que nós. Se as reformas estivessem feitas, Portugal não seria, como é, hoje, campeão do desemprego, campeão do endividamento, campeão da despesa, campeão do desperdício, campeão das falências, campeão do facilitismo e campeão da injustiça.

- a prova de que este PM insiste no erro, persiste na ilusão e resiste ao mero bom senso, sendo portanto um caso irremediável, está em quatro factos recentes:

a) o relatório do BdP confirma aviso do CDS: o aumento sucessivo de impostos, o aumento duplo do IRS, o projectado aumento de contribuições, ferem a economia real, liquidam a criação de emprego e eliminam o crescimento.

b) Pelo contrário a desqualificação de Portugal pelas agências de rating não confirma a promessa feita pelo Governo e pelo PSD, segundo o qual as medidas tomadas acalmariam os mercados e susteriam o nosso declínio;

c) O anúncio feito pelo Governo de que a 3ª Ponte vai ser lançada em breve, confirma o aviso que o CDS fez: a assinatura do TGV tinha como propósito tornar inevitáveis as outras Grandes Obras agora a ponte para obter a ligação ao TGV a Lisboa, amanhã o Aeroporto para ligar ao TGV.

É espantoso como o Governo prossegue na rota do endividamento, numa altura em que, economicamente, Portugal está a endividar-se, não para crescer, mas para empobrecer; é incompreensível como é que o PSD aceitou o aumento de impostos sem exigir, em contrapartida, garantias sobre a suspensão dos grandes projectos.

d) A novela das SCUT não confirma a promessa de bom senso feita pelos Partidos do PEC; As Estradas de Portugal, se não estão em ruptura, estão perto; as SCUT custam oficialmente 540 ME ao contribuinte; ainda assim, com todos os sinais vermelhos acesos, PS e PSD trocam alegremente descontos, isenções e excepções, de modo que metade do 2º aumento do IRS vai direitinho para pagar isenções, excepções e descontos nas SCUT.

e) Ainda hoje, perante uma proposta sólida do CDS para reduzir, não a despesa social, mas a despesa do Estado-administração, do Estado-empresa e do Estado-aparelho, em mais de 1000 Milhões de euros, o sr. aos costumes disse nada. Fica bem à vista que o aumento do IRS é uma escolha sua, não é uma inevitabilidade do país. E sr. PM, reduzir menos é pagar mais; quem vai deduzir menos são, em cheio, os contribuintes do 3.º, 4.º e 5.º escalão do IRS. Desde quando é que famílias com 800€ são ricos?

II

- Creio ter sido absolutamente claro: os Portugueses foram enganados pelo Primeiro-Ministro, não confiam na sua palavra, não acreditam na sua atitude e estão muito cépticos quanto aos resultados das medidas que vão ser tomadas.

Para a maioria dos Portugueses, José Sócrates já é o passado; é um passado que lhes pesa; como sair desse passado é a questão que mais importa.

- Perceba isto, sr. PM: a sua maior qualidade a determinação deixou de prestar o menor serviço ao País. É impossível não concluir que o sr. é determinado no erro, na ilusão, na fantasia.

- Sucede que tão grave como o declínio económico que muitos vêem, é o impasse político que estamos a viver. Quanto mais os cidadãos sentem a grandeza do problema económico, mais pressentem a exiguidade das respostas políticas. Daí o sentimento de insegurança nos cidadãos, aliado a um grande cansaço com a política e frustração com os políticos.

- Tentarei caracterizar sucintamente, os elementos do impasse político.

1. Os Portugueses sabem que, perante uma profunda crise económica, temos um mau Governo;

2. Apesar da desconfiança do país neste Governo, este Primeiro-ministro não se atreve a colocar aqui uma moção de confiança, pela simples razão de que teme perdê-la e ser confrontado com a vontade popular;

3. Em alternativa, qualquer moção de censura, apresentada nesta câmara, não prospera, pelo simples facto de que o PSD salvará o Governo;

4. PS e PSD fazem juntos tudo o que o Governo quer, mas não querem estar juntos no Governo;

5. O PM está tão descredibilizado que dificilmente conseguirá fazer uma remodelação que desse um novo fôlego: quem entre o pessoal de qualidade aceita dar caução a um PM que já é passado?

6. Enquanto o país económico pode estar a caminho de uma recessão, o país político pode estar a dirigir-se para um absurdo: vem aí o Orçamento de Estado, será votado quando o Parlamento já não pode ser dissolvido e se o Governo insistir em aumentar impostos outra vez o país arrisca-se a ficar nesta situação: nem tem Orçamento, nem pode ter eleições;

7. Mesmo que, depois das eleições presidenciais, haja condições para uma mudança política, a mera conjugação dos prazos insolitamente longos que estão na Constituição, permite perceber que Portugal só terá um novo Governo, um novo caminho, um novo rumo, daqui a mais de um ano.

- Os elementos do impasse são estes. Pergunto: pode Portugal, na situação dificílima em que está, ficar mais um ano à deriva?

- Uma nota suplementar sobre uns dos elementos deste impasse: PS e PSD alimentam uma guerrilha pública que não é coerente com o acordo que, no essencial, estabeleceram. O caso da revisão constitucional é o mais estridente:

Não está aberta, ninguém conhece as propostas, é um assunto muito sério porque toca a lei fundamental de todos nós, mas está a servir ao PS para fazer de conta que é socialista; e ao PSD para fazer de conta que não tem um acordo com o PS.

O caso dos impostos é o mais penoso: O que o Governo nunca tinha dito, é que ia aumentar, segunda vez, a retenção na fonte do IRS; mas o PSD bem sabe o risco em que colocou o país, viabilizando aquele PEC, onde a questão das deduções estava escrita, sem precisar o ano a que diziam respeito. A duplicidade de uns e de outros não ajuda nada a autenticidade política que os portugueses exigem.

III

- Perante o declínio económico de Portugal;

- Perante o impasse político que descrevi, é minha obrigação dizer aqui o que em consciência penso e também o que o meu patriotismo reclama:

- Senhor Primeiro Ministro: o Senhor é o passado e já não recupera; os Portugueses não o vêem como solução, vêem-no como problema; acham que quem nos trouxe a esta crise não é capaz de nos tirar desta crise.

Ponha a mão na consciência; perceba o mal que está a fazer ao país e tenha um gesto de humildade: saia!

- Permita que o seu partido escolha outro primeiro ministro. Escolham alguém moderado e com os pés assentes na terra. E se quer saber, em minha opinião, o que o país, nesse caso e só nesse, devia ter, era uma coligação entre PS, PSD e CDS, para três anos, com o objectivo de tirar o Portugal deste atoleiro ou deste pântano se preferir mas isso, consigo, não é possível.

De certo o país apreciaria uma garantia de estabilidade e um exemplo de patriotismo;

Decerto as instituições internacionais apreciariam, neste tempo excepcional, uma solução de Governo verdadeiramente excepcional;

O pedido que lhe faço é difícil; mas a solução que ofereço ao País é responsável.

Trata-se de fazer um esforço consistente para que Portugal não perca mais tempo e disponha de um Governo capaz de enfrentar seriamente o endividamento; promover o crescimento económico; perceber que sem empresas não há empregos; garantir, ainda para mais em tempo de crise, a segurança das pessoas e dos seus bens; apostar na excelência da educação; e quanto ao Estado-Social, compreender que mais importante do que salvar o Estado é salvar o Social, recorrendo a todas as instituições da sociedade civil que trabalham com os desfavorecidos.

Já seria um começo de futuro. Porque quanto ao presente, como diria o Professor Adriano Moreira, não vejo remédio.

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